Sons da Perifa https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br Um blog sobre cultura periférica, a voz da periferia Mon, 13 Dec 2021 15:07:17 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Quadra de basquete recebe nome de Kathlen Romeu, grávida morta em ação policial https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/09/14/quadra-de-basquete-recebe-nome-de-kathlen-romeu-gravida-morta-em-acao-policial/ https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/09/14/quadra-de-basquete-recebe-nome-de-kathlen-romeu-gravida-morta-em-acao-policial/#respond Tue, 14 Sep 2021 13:00:05 +0000 https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/files/2021/09/nova_kk-300x215.jpg https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/?p=719 No último domingo, 12 de setembro, uma quadra de basquete em frente a comunidade do Jacarezinho foi inaugurada e batizada de “Quadra Klathen Romeu”, jovem de 24 anos, morta no dia 8 de junho por uma bala perdida no complexo de Lins, zona norte do Rio de Janeiro, enquanto visitava a mãe. 

Através de financiamento coletivo, doações de outros projetos e parceria com a agência Redes para Juventude, onde foram incluídos na ação “Contra-Ataque”, o Jacaré Basquete, grupo de ex-atletas de basquete que ajudam jovens de comunidade a ter outras perspectivas de futuro, resolveram revitalizar a quadra estava depredada e abandonada..

Partida de basquete durante inauguração da quadra ‘Quadra Kathlen Romeu’ (Foto: Pedro Siqueira)

Thiago Nascimento, 24, idealizador do projeto, comenta que a transformação durou 15 dias. “Era um espaço completamente abandonado. Com o apoio dos grafiteiros Antônio TON e Pandro Nobã, pintamos e revitalizamos a quadra. Para a inauguração, escolhemos o nome da Klathen Romeu e pedimos ao vereador Márcio Ribeiro, do AVANTE-RJ, para apresentar esse projeto de mudança de nome na câmara”.

Em nota, o vereador Márcio Ribeiro endossa o pedido feito pela comunidade: “Daremos entrada em um projeto de lei que pede que seja dado o nome da jovem Kathlen Romeu na quadra esportiva. Realizaremos isso para homenagear a jovem, que morreu tragicamente após ser atingida por uma bala perdida, no Complexo do Lins. Esta homenagem é uma forma de manter vivo o espírito da jovem, que era conhecida por todos como uma pessoa alegre, cheia de  esperanças e sonhos, mas que infelizmente não teve tempo de realizá-los.”

Durante a inauguração foram distribuídos brindes da NBA Store para as crianças (Foto: @viajantelirico)

A quadra teve também ajuda do projeto Paraíso do Basquete, idealizado pela plataforma Payback. Daniel Lorio, 27, fundador da empresa, comenta que resolveram ajudar essa iniciativa por acreditarem que o Jacaré Basquete tem potencial de impactar pessoas a partir da prática do esporte. 

“Apoiar foi uma ótima oportunidade para revitalizarmos nossa primeira quadra de basquete na zona norte do Rio de Janeiro. Compartilhar os mesmo valores que o Jacaré Basquete ajudou nessa parceria. O Paraíso do Basquete ainda prevê ajudar outros projetos socioesportivos em diferentes lugares da cidade”, conclui o empresário.

Imagem aérea da quadra na zona norte do Rio de janeiro batizada de ‘Quadra Klathen Romeu’ (Foto: Divulgação)

Durante o evento, os familiares de Klathen Romeu receberam flores e uma placa com o seu nome da ex-modelo. Kits da NBA Store e Decathlon foram distribuídos as crianças que também puderam participar de uma oficina de batalhas de rimas.

Outra atração foi um campeonato improvisado de “3×3”, jogo disputado em uma das metades da quadra com duas equipes com três jogadores, teve o “Basquete Cruzada”, outro projeto de incentivo ao esporte, primeiro campeão do espaço.

Thiago Nascimento, 24, idealizador do projeto Jacaré Basquete segura a placa com o novo nome da quadra (Foto: Divulgação)

O acesso a direitos básicos como saúde mental, física e lazer foi o que motivou Thiago nessa trajetória. “O nosso projeto atua nas regiões do Jacaré e Jacarezinho por que acreditamos que o esporte é uma ferramenta de inclusão social. Nosso intuito é acolher jovens melhorando a qualidade de vida dos moradores da região” conclui o idealizador.

Quem quiser visitar a quadra, o espaço fica na Rua Reginaldo Pardelha, s/n., no bairro do Cachambi, zona norte do Rio de Janeiro. Mais informações podem ser encontradas no perfil do Instagram @jacare.basquete.

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Não é cedo demais para saber que a vida é desgraçada aqui https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/06/09/nao-e-cedo-demais-pra-saber-que-a-vida-e-desgracada-aqui/ https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/06/09/nao-e-cedo-demais-pra-saber-que-a-vida-e-desgracada-aqui/#respond Wed, 09 Jun 2021 18:08:05 +0000 https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/files/2021/06/E3ZJQDeXEAsyL1v-e1623261628178-300x215.jpg https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/?p=619 “Será que são tiros ou fogos?”. Saber diferenciar fogos de tiros é uma competência que só a quebrada te dá. 

Agacha, deita, vai pra debaixo da cama, faça isso sempre que ouvir fogos e tiros.

Não vivemos em uma guerra. No confronto armado entre nações, os soldados dão suas vidas para defender seus cidadãos, seu território e sua nação. Aqui, os soldados brincam de tiro ao alvo e mesmo quando erram, acertam.

Kathlen Romeu, 24, viva, sempre sorridente, transmitia bem-estar a todos ao seu redor. Levava uma vida com ela, segurava essa vida com as mãos, os braços e a barriga. Teve a infelicidade de nascer mulher, negra e periférica.

A guerra às drogas aqui é uma espécie de “Malhação” da deep web: renovada anualmente, apenas altera os personagens, os atores, novas histórias sempre com os mesmos finais. Ninguém liga, ninguém se importa, mas todo ano tem uma temporada nova.

No clima quente do Rio de Janeiro, a minha gente soa frio. Nunca mais eu vou sorrir.

Na periferia, favela, quebrada, morro é como viver em um campo minado. Você pode estar passando ao lado de uma boca de fumo com pessoas armadas e não acontecer nada, pode visitar sua mãe e tomar um tiro. A bala da AK-47 sempre será encontrada, às vezes no muro, sempre em corpos pretos.

“Pelo amor de deus doutor!” Aqui fora revolta e dor, lá dentro estado desesperador. Assustador é quando se descobre que tudo deu em nada e que só morre pobre.

Poucos pretos e pobres têm a chance de morrer de velhice. Helena Malta das Candeias, minha bisavó, morreu um mês antes de completar 97 anos por conta de uma infecção generalizada. Privilegiada em viver muito, azar em ser preta. Viu a morte dos pais, marido, filhos, sobrinhos, netos e bisnetos.

“Essa historinha é contada há anos, que a polícia foi recebida a tiros. Quem foi recebida a tiros foi a minha filha!”, desabafa Jackeline, mãe da Kathlen.

A vida é desgraçada aqui.

Uma “revolução Haitiana” seria a única solução. Dizimar o estado que trabalha como uma máquina de moer pobre. Aqui no Brasil, a política de extermínio do povo preto anda de vento em popa como os navios negreiros de 1500, onde histórias de mulheres negras grávidas eram lançadas ao mar e seus filhos se tornavam reis do oceano.

2021. Matam mulheres grávidas seja por bala ou cloroquina, e o silêncio do Pró-Vida é ensurdecedor. O nazismo é aqui.

“Mulher branca grávida morre após levar um tiro, após um tiroteio em seu apartamento no Leblon, zona sul do Rio de Janeiro, entre policiais e bandidos”. Uma notícia dessa derruba o secretário de segurança, prefeito, governador e, se ela for de direita, a família receberia visita até do presidente da República pedindo desculpas e indenizações. 

Como Kathlen é preta e estava na favela, “a polícia diz que foram apreendidos um carregador de fuzil, munições de calibre 9 mm e material entorpecente a ser contabilizado”. Não precisa de muito para justificar. O secretário diz que a área é perigosa e abafa o caso.

E esse foi apenas mais um episódio de “Malhação”, ninguém liga, ninguém se importa e o final é sempre o mesmo.

Aguardem cenas do próximo episódio.

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