Sons da Perifa https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br Um blog sobre cultura periférica, a voz da periferia Mon, 13 Dec 2021 15:07:17 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 O rap ainda é uma competição injusta para músicos nordestinos, afirma Don L https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/11/26/o-rap-ainda-e-uma-competicao-injusta-para-musicos-nordestinos-afirma-don-l/ https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/11/26/o-rap-ainda-e-uma-competicao-injusta-para-musicos-nordestinos-afirma-don-l/#respond Fri, 26 Nov 2021 14:19:38 +0000 https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/files/2021/11/WhatsApp-Image-2021-11-25-at-20.46.02-300x215.jpeg https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/?p=830 Há dez anos, Gabriel Linhares da Rocha, nome de batismo do rapper Don L, reunia dinheiro e motivação para ir a São Paulo, deixando para trás Fortaleza, sua terra natal. A trajetória dessa jornada é o pano de fundo do seu novo disco “Roteiro para Aïnouz, Vol.2”, segundo da trilogia anunciada pelo cantor, que foi lançado na madrugada desta sexta (26) nas plataformas de streaming de música. Nele o cantor narra as estradas em que percorreu e imagina novos caminhos para o futuro Brasil.   

Diferente do disco anterior onde o músico de 39 anos expressa a decepção ao chegar na capital paulistana, desta vez, Don L usa os acontecimentos durante seu trajeto de 3000 quilômetros entre as duas cidades como metáfora de morte e renascimento. “Quando falo de um bandido do século dezoito e a corrida do ouro, na faixa Vila Rica, o cenário pós-apocalíptico de quando morrem os grandes sonhos e a vida acaba se torna uma guerra particular. A morte, e então o renascimento, a reconstrução deles a partir das cinzas da destruição do colonialismo, esse fracasso civilizatório que permeia nossas vidas por todos os lados.” afirma o cantor.

Outro tema sempre presente nas músicas de Don L é a desigualdade feita em sua visão pela indústria do rap, que prestigia menos os músicos do nordeste do país em comparação com o cenário do mesmo ritmo no sudeste —mas confessa ter visto mudanças. “Acho que contribuí para um progresso nesse sentido, de tornar possível rappers do nordeste se colocarem como competitivos na cena nacional. Mas continua sendo uma competição injusta, desigual. A mudança real tem a ver com estruturas muito mais profundas, com projeto de país e nossa diversidade cultural. E, no momento, o que existe é o desmonte do que já era frágil”.

Don L durante gravação de clipe para seu novo álbum ‘Roteiro pra Aïnouz, vol. 2’ ( Foto: Bel Gandolfo/ Divulgação)

O disco que tem assinatura artística de André Maleronka, mesmo dos últimos três trabalhos do cantor, traz diversas participações como Tasha e Tracie, Djonga e Alt Niss e faz o cantor se unir a cena mais nova do rap. “Nesse disco eu tento propor novos caminhos a partir de elementos que essa nova escola traz”.

Don L ainda afirma que uma das propostas do disco é conversar com a geração que o tem como inspiração, e que isso o tem incentivado a estar atento a outros ritmos derivados do rap. “Sempre bebo da água dos clássicos da música brasileira e do hip-hop mundial. Vou do funk, trap e drill aos clássicos do samba”.

Outro destaque é a capa do álbum —que virou até filtro no Instagram— teve projeto gráfico de Filipe Fillipo e fotografia de Autumm Sonnichesen. A obra faz uma releitura do disco “The Chronic” do rapper Dr Dree e mistura referências de discos dos selos americanos Strata-East e Black Jazz.  

Esse enredo criado por Don L e sua equipe foi pensado em parte como uma obra cinematográfica. “O tema do disco faz referência ao diretor de cinema cearense Karim Aïnouz. A opção de fazer uma trilogia reversa tem a ver com minha trajetória, de ter demorado a ser reconhecido na cena musical brasileira. Tenho uma longa história para contar e ressignificar o passado para aí sim construir um caminho novo para um futuro que valha a pena a luta”.

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Nego Bala: A música é a única liberdade quando se está preso https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/11/24/nego-bala-quando-se-esta-preso-a-unica-liberdade-e-a-musica/ https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/11/24/nego-bala-quando-se-esta-preso-a-unica-liberdade-e-a-musica/#respond Wed, 24 Nov 2021 15:00:14 +0000 https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/files/2021/11/1637600465619bccd1b19be_1637600465_1x1_lg-300x215.jpg https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/?p=814 Um provérbio africano diz: “nunca se esquecem as lições aprendidas na dor”. Foi com esse cruel sentimento que Marcelo Abdinego Justino Genero, nome de origem do funkeiro Nego Bala, aprendeu a conviver.

O músico foi criado pelo pai, que era ambulante, e sua mãe, dependente química. Ele cresceu na Boca do Lixo, como é popularmente conhecida uma região na Luz, área central de São Paulo, e passou pela Fundação Casa ainda na adolescência

Este episódio da vida do músico, hoje com 23 anos, é o que inspira seu álbum de estreia, lançado nesta quarta-feira, 24. em formato audiovisual. Intitulado “Da Boca do Lixo”, o disco é composto por nove faixas.

A obra é um breve resumo da vivência do cantor, que foi um garoto da Cracolândia, viveu intensamente a rua e acabou seguindo por caminhos mais próximos, como o crime. “Usei a arte como válvula de escape. Escrevendo, compondo e cantando”, afirma o MC.

Além do disco, um curta-metragem com voz da cantora Elza Soares, revisita os dias que o MC esteve privado da liberdade. Idealizado pela AKQA\Coala.LAB e produzido pela Stink Films —mesma produtora de Bluesman, do rapper Baco Exu do Blues, vencedor de um Grand Prix na categoria “Entertainment for Music” do Cannes Lions— o filme está disponível no canal de YouTube do Nego Bala.

“Ter a Elza é uma responsa muito grande por se tratar de uma artista completa. Ela cantando uma poesia que escrevi quando era menor, com toda atenção e carinho do mundo, foi emocionante. Eu ainda estou processando toda essa história, espero ter chegado à altura do que ela representa”, conta o funkeiro que tem a companhia da cantora também na música “Sonho”, presente em seu novo disco.

O curta de aproximadamente dez minutos de duração, dirigido por Douglas R. Bernardt, apresenta a passagem de Nego Bala pelo centro de detenção para jovens como ponto de partida de uma trajetória por novas possibilidades para além daqueles muros. “A gravação foi um flash de várias emoções e um misto de aprendizado monstro pelo qual passei”, afirma o MC.

O enredo do vídeo exibe a vasta capacidade da dança e da música de se conectar a ancestralidade do povo negro e ligar o passado com o presente. Conexão que é presente na vida de Nego Bala desde a infância. “O Rap estava no meu dia a dia sempre. Ouvia Sabotage, Racionais MCs, Consciência Humana, De Menos Crime, Facção Central e SNJ. Viver no centro histórico de São Paulo é conviver com a música.”

Nego Bala em cena do curta-metragem da música ‘Sonho’, que gravou com Elza Soares (Foto: Larissa Zaidan/Divulgação)

Por outro lado, o cantor afirma que não teve pessoas próximas que o inspirasse na carreira de músico. “Na Cracolândia, minha quebrada, eu não via muito MC’s. Na verdade, nenhum. Isso me motivou bastante também em levar o nome do Centro pro mundo, mostrar que temos voz”, diz o músico.

Esse desejo foi a motivação que teve quando ainda era interno. Nego Bala afirma que sempre foi seu sonho lançar um disco quando estivesse em liberdade. Essa meta foi fundamental para que ele se mantivesse em equilíbrio, mas também serviu de inspiração para seus parceiros de detenção.

“Quando você está preso, a única coisa que você tem para se libertar é a música”, afirma. Ele acrescenta: “boa parte do que escrevi privado da liberdade está no álbum. A atmosfera rítmica da cadeia tá toda no disco também. A música está soando como eu queria ouvir. Espero que as pessoas gostem do trabalho que fizemos”.

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