Sons da Perifa https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br Um blog sobre cultura periférica, a voz da periferia Mon, 13 Dec 2021 15:07:17 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 ‘Remédio para racista é bala’, diz Nic Dias em nova música https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/06/17/remedio-para-racista-e-bala-diz-nic-dias-em-nova-musica/ https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/06/17/remedio-para-racista-e-bala-diz-nic-dias-em-nova-musica/#respond Thu, 17 Jun 2021 17:01:45 +0000 https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/files/2021/06/nova_____-300x215.jpg https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/?p=628 Raiva, indignação e polêmica são os ingredientes para o novo single da cantora paraense Nic Dias, “Remédio pra Racista é Bala”. Traduzindo versos como “rima de preto é carnificina”, a rapper Nic Dias, ao lado do cineasta paraense Vlad Cunha, diz dar uma resposta ao do genocídio da juventude negra brasileira.

A música já disponível nas plataformas de streaming anuncia o seu primeiro EP, “1.9.9.9.”, projeto aprovado pela Lei Aldir Blanc Pará com produção executiva da Psica Produções.

Narrando a reconquista do poder do povo preto e a destituição do império branco, a letra da música conta a história de um assassinato como via para rebater o racismo institucional. No clipe, ela é a protagonista de um sequestro e da tortura de um personagem que representa o racismo no Brasil. “Eu acredito que não há como ter justiça sem equidade, sem ter uma reação pro racismo que as pessoas cometem. ‘Remédio pra Racista’ é justamente essa reação. Tudo que a gente faz gera um efeito e violência gera violência”, justifica Nic sobre a música, já conhecida pelo público que frequenta os shows. “As pessoas se identificaram muito com as coisas que eu falo nela e acho que precisava de alguém pra falar sobre isso”.

A violência sofrida pelos pretos é um dos temas centrais da obra de Nic Dias, que mora em Icoaraci, distrito periférico da capital paraense. Desde os 14 anos, Nic escreve poemas e crônicas sobre a realidade que vive ao lado de sua mãe, que sempre a acompanha nos palcos.

A cantora Nic Dias em divulgação do seu novo single “Remédio para Racista é Bala” (Foto: Tuyuka Lara)

Para dar cor e ainda mais vida ao universo da letra de “Remédio pra Racista é Bala”, Nic teve parceria do cineasta paraense Valdimir Cunha, que já dirigiu filmes para Dona Onete, Felipe Cordeiro, Molho Negro, e assina co-direção no documentário Brega S/A. Vlad se inspirou no universo estético do grindhouse dos anos 70, marcado pela decadência urbana, o desencanto e a violência contada através de peças de baixo orçamento. Essa violência de gangues urbanas dos Estados Unidos no período da Guerra do Vietnã foi traduzida para o sentimento de revolta da população negra brasileira.

“O clipe é uma tradução do sentimento de tá no limite que o que a letra da Nic fala muito. Até que ponto alguém aguenta e consegue viver com essa violência racista cotidianamente e intermitente? A gente começou a construir esse universo dessa gang que a Nic tem, e que está ali com ela numa situação de dar o troco. Tudo em uma fotografia muito claustrofóbica e propósito”, detalha Vlad sobre o videoclipe.

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‘Sonho em fazer clipes pelo mundo’, diz MC Soffia que completa 10 anos de carreira https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/04/01/sonho-em-fazer-clipes-pelo-mundo-diz-mc-soffia-que-completa-10-anos-de-carreira/ https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2021/04/01/sonho-em-fazer-clipes-pelo-mundo-diz-mc-soffia-que-completa-10-anos-de-carreira/#respond Thu, 01 Apr 2021 16:25:47 +0000 https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/files/2021/04/DSC_2036-300x215.jpg https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/?p=507 Aos 17 anos e com uma carreira de dar inveja a qualquer MC iniciante, MC Soffia conta que em 1o anos os temas da quebrada continuam os mesmos

Há dez anos, Soffia Gomes da Rocha Gregório Correia era apenas uma criança de 7 anos, criada na zona oeste de São Paulo, que mesmo tão pequena já começava entender seu papel no movimento negro e periférico. Hoje, adolescente e com o currículo no rap de dar inveja a qualquer MC de primeira viagem, MC Soffia continua cantando letras de valorização da beleza da mulher negra e de empoderamento feminino.

Foi uma década de muito trabalho para ela, sua mãe Kamilah Pimentel, que é sua produtora musical e que estuda direitos autorais, e sua avó Lucia Regina, que a assessora em sua carreira. “O legal da minha família materna cuidar da minha carreira é que para fazer uma reunião eu nem preciso sair de casa”, comenta a rapper.

Em meio a pandemia e com perdas de familiares pelo coronavírus, Soffia tem focado em estudar idiomas e produzir cada vez mais músicas. “Meu sonho é fazer clipes ao redor do mundo e ser reconhecida na América Latina”, comenta a rapper que se apresentou na cerimônia de abertura das Olimpíadas Rio 2016 com a também rapper Karol Conká.

Internet, cancelamento, empoderamento e futuro no rap foram alguns assuntos que conversei com Soffia e que você pode conferir agora.

Família e carreira 

Minha família materna é a que cuida da minha carreira. Minha mãe, por exemplo, está fazendo faculdade de direito para entender melhor sobre direitos autorais. Eu gosto muito da forma que é, me sinto confortável, se preciso fazer uma reunião, já estamos em casa. Quando eu falo, “quero lançar essa música, com esse beat”, eles entendem e acreditam muito em mim.

Eu sempre me impus bastante em como eu queria na minha carreira, seja nas roupas, nos videoclipes, nos beats das músicas, nas letras, então minha família se acostumou a sempre me ouvir e apoiar o que eu quero. 

A rapper MC Soffia (Foto; Divulgação)

17 anos e muito a percorrer

Sempre quis ter uma carreira artística, sempre quis mais do que só cantar. Já fui modelo, já fui atriz, participei de filmes e séries, quero muito continuar com isso. Quero criar uma marca de sapato. Eu tenho muita coisa na cabeça.

Representatividade e o sonho de produzir desenhos

Eu gosto de desenhos animados. Quando eu era mais nova, eu sentia falta de ter um desenho com uma menina preta. Só quando eu tinha uns 10 anos que comecei a assistir a “Doutora Brinquedo” [desenho do canal pago Disney Junior]. Ela é super importante, acho que deveria ter mais desenhos como esse.

Não temos que nos contentar com a minoria nos desenhos. Eles falam: “vamos colocar um preto aqui para contemplar o quadro de pretos”. Mas eles não entendem que a maioria no Brasil são pessoas pretas. Por isso não quero ficar me contentando com um personagem preto só no desenho. 

Por isso quero ter o meu próprio programa de TV. Ele teria apenas pessoas pretas, os convidados seriam jovens e eu seria a apresentadora. Cada dia eu estaria com um cabelo diferente para que as meninas começassem a se inspirar, ter referências. E não só de mim, mas também de outras pessoas do programa.

E quero também fazer um desenho para crianças. Se deixar, a minha irmãzinha assiste desenho o dia todo. Quando eu vejo o que ela tá assistindo, nunca são desenhos de pessoas pretas. Então eu gostaria de criar um desenho nesses canais tipo Gloob ou Discovery Kids, de uma adolescente preta que teria o cabelo black armado, ela seria uma sneakerhead [uma colecionadora de tênis], e cada dia da semana ela pegaria um de seus tênis para fazer um esporte. Na segunda, ela pegaria o tênis de skatista; na terça, de basquete; na quarta, de futebol, e aí por diante. E faria todos esses esportes, todas essas coisas radicais sendo uma mulher, sendo preta e se divertindo. As amigas dela seriam rappers, elas usariam fone de ouvido, caixa de som… Eu queria trazer esse tipo de conteúdo nos desenhos.

Pandemia e estudos

Eu perdi meu avô e tio por parte de pai. São tempos muito tristes. A gente nem sabe quando as coisas vão melhorar, os 40 dias da quarentena já passaram e continuamos dessa forma. Então nesse momento, eu estou me planejando. Como a minha equipe é familiar, a gente vem fazendo várias reuniões para conversar sobre lançamentos, sobre divulgações. Não estou só escrevendo música, estou fazendo outros projetos também. Estou aproveitando esse momento para isso: para fazer muita música, para estudar bastante, fazer meu curso de espanhol e inglês, terminar meus estudos. Quero me estruturar nesse momento.

Internet, bullying e cancelamento

Sempre entendi que a internet tem um lado bom e ruim. O bom é que eu consigo mostrar meu trabalho de forma bem mais fácil, o ruim é que qualquer um pode comentar positivamente ou negativamente. 

A Karol Conká é muito correria. Trabalhamos juntas na abertura das Olimpíadas e depois disso, sempre que dava, eu estava junto com ela. Quando ela foi para o BBB, e depois que tudo aconteceu, eu vi que a crítica às mulheres pretas tem um peso maior no linchamento. Eu como mulher preta, não vou criticar ela na internet. É isso que a internet quer, eles querem colocar um preto contra o outro. 

Eu não assisto BBB, mas não tinha como não saber de tudo. O cancelamento na internet foi muito grande. Eu não vou ficar criticando, posso dar minha opinião dentro de casa, mas nunca na internet.

Ídolos, referências e trap

As meninas no trap estão vindo com tudo. Eu prefiro muito ouvir mulheres do que homens. Elas trazem letras bem mais avançadas, você ouve e percebe como são complexas, elas juntam uma coisa na outra. Ouço muito Tasha e Tracie, essas meninas têm acrescentado muito na cena do trap.

Mas sempre tive como maior ídolo a Beyoncé, ela sempre foi a minha maior referência na música. Desde que eu decidi ser cantora, eu me inspiro nela. Na sua postura, personalidade, no jeito que faz os shows, nas suas roupas, ela é maravilhosa. Mas gosto muito também da Rihanna, da rainha do rap Nicki Minaj. E tenho ouvido muito mulheres que cantam letras empoderadas como a Lizzo, Normani, a Iza, Ludmilla, Tássia Reis. Minha playlist tem muita mulher boa.

Até por isso, em todas minhas inspirações na música, eu trago referências americanas. Eu fico vendo os looks, os beats das músicas, como eles compõem. Eu pego tudo isso e trago para o meu estilo aqui, escrevo as letras com empoderamento e uso o rap para falar o que eu estou sentindo, o que vejo nas periferias. Observo muito como a sociedade se comporta, por isso falo tanto de racismo, feminismo, amor próprio, empoderamento. 

O antirracismo, palavra que parece que surgiu recentemente, o Black Lives Matter e as manifestações que aconteceram no passado, tudo isso já apareciam nas minhas letras. Sempre falei do racismo.

Invisibilidade na música

As mulheres estão conseguindo cada vez mais espaço na música, seja no rap ou no sertanejo. Com a ajuda da internet, estamos tendo mais visibilidade. O machismo nos obriga a lutar sempre.

Fiz uma música que vou lançar esse ano chamada “Papo Reto”. Ela fala da invisibilidade da mulher no movimento musical, não só o rap, mas sertanejo, funk, trap, em todas as áreas da música. Por mais que no sertanejo as mulheres tenham alcançado um lugar legal, os homens ainda são muito mais famosos que elas.

Vi uma matéria recentemente que dizia que a Marília Mendonça, antes de começar a cantar, escreveu muitas letras de músicas que são estouradas no Brasil. Quando ela meteu as caras para cantar suas próprias músicas, ela representou muito as mulheres na cena.

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Nic Dias fala sobre trap na Amazônia: ‘eu existir e trabalhar com rap já é uma vitória’ https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2020/08/17/nic-dias-fala-sobre-trap-na-amazonia-eu-existir-e-trabalhar-com-rap-ja-e-uma-vitoria/ https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/2020/08/17/nic-dias-fala-sobre-trap-na-amazonia-eu-existir-e-trabalhar-com-rap-ja-e-uma-vitoria/#respond Mon, 17 Aug 2020 15:02:16 +0000 https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/files/2020/08/Nic2-por-Vitoria-Leona_3-300x215.jpg https://sonsdaperifa.blogfolha.uol.com.br/?p=75 “Não tem essa de rap de mina, rap é rap. Quando você for ouvir um rap ouça as rimas ao invés de falar que não tem rap de mina. Se você tem internet pra falar besteira tem para dar um google”. A opinião é da cantora Tasha, durante a live com sua irmã Tracie, em resposta a mensagens preconceituosas de alguns internautas durante a transmissão.

Talvez você ache que para ser rapper é preciso ter cara de mau ou ser durão, “sem risadinha porque aqui é o rap onde o povo é brabo entendeu? O povo é mau! Mau! Para trabalhar nesse emprego de rapper você tem que ser mau”, diz Emicida com sua filha gargalhando ao fundo na música “Cananéia, Iguape e Ilha Comprida”.

É, o rap definitivamente não é isso, mas durão? Bom, isso a mulher preta de quebrada tem de sobra.

A rapper Nic Dias (Foto Vitoria Leona)

Periferia é periferia em qualquer lugar, seja da ponte pra cá ou da ponte aérea pra lá de Belém do Pará, mais precisamente na periferia de Icoaraci onde Nicole Dias, 21, conhecida como Nic Dias nas redes faz sucesso como rapper, ativista e compositora.

“O rap já estava presente na minha vida desde pequena. Na real, todo mundo aqui na periferia ouve rap, além dos sons ‘mais regionais’ como o tecnomelody, os clássicos do Racionais Mc’s sempre estiveram presente em todas as periferias do Brasil, inclusive aqui”, diz Nic Dias. Prova disso foi um vídeo que viralizou onde mostra a reação emocionada de um vendedor ambulante no meio da multidão em pleno carnaval de Salvador, ao ver o Mano Brown subindo no trio para cantar Negro Drama.

“Mandinga, coisa nossa. Eles não vão entender o que são riscos, e nem que nossos livros de história foram discos” já dizia Emicida na música “Ubuntu Fristili”. Na quebrada, a música forma caráter e mostra quem somos e para onde vamos. Nic conta que mesmo que de forma inconsciente, o rap estava presente na sua vida.

“Durante a pré-adolescência eu passei a prestar mais atenção ao que o rap sempre me disse, por começar a vivenciar de modo mais agressivo as diversas formas de violência que atravessavam o meu corpo”, relembra ela que afirma que ao se questionar o porquê disso tudo, notou o rap dialogando sobre autonomia, algo que ela nunca aprendeu na escola. “Passei a entender melhor quem eu era e a entender a figura do negro no Brasil”.

Entre guitarradas e tecnomelody, ritmos com espaços popularmente consolidados nas quebradas paraenses, o rap veio chegando “devagar devagarinho” na cena musical das comunidades.

“O movimento hip hop em Belém existe desde os anos 1990. Foi com muita luta que os irmãos e as irmãs do movimento foram construindo esse espaço dentro do cenário musical daqui, mesmo com muita opressão por ser um ritmo marginalizado socialmente, e de toda a questão da falta de estrutura e recursos, a cena vem se construindo aos poucos”, diz Nic.

Ela completa ainda que fazer trap na Amazônia é bem difícil, principalmente, quando se deixa de lado “aquele regionalismo estereotipado de falar sobre açaí com camarão, farinha, Ver-o-Peso’’.

“Acredito que a aceitação em si é a menor dificuldade enfrentada pelos artistas de rap nortistas. O maior problema é a falta de infraestrutura, o acesso aos recursos, ou seja, o leque de possibilidades de profissionalizar a tua arte é bem pequeno, e como as pessoas vão levar a sério o que tu faz?” completa.

Mas como qualquer ritmo de quebrada, o trap só se fortalece com as dificuldades. Nic, por exemplo, até cita alguns parceiros que estão na mesma “caminhada” que ela no Norte, como MC Super Shock, CPG77, Ruth Clark MC, Yasmin Oss, Drin, Pele do Manifesto, Bruna BG, e o Navi Beatz. Mas, ela avisa, que a lista de “artistas incríveis aqui no estado (Pará) é infinita”.

Entre Dina Di, considerada por muitos a primeira rapper, e Nic Dias, muita coisa mudou para as mulheres na cena.

“Eu não costumo falar que meu som é empoderamento feminino, eu gosto de imaginar que só o fato de eu existir e estar trabalhando com rap já é uma vitória para nossa comunidade negra”, diz Nic que explica que para além do recorte feminino, costuma pensar que sua luta é coletiva para homens negros e mulheres negras, da periferia ou não e cita o rapper Kayuá que afirma que: “ver preto vencendo já é uma mensagem”.

Longe de ser uma voz melódica no trap, Nic Dias veio com rimas pesadas no seu último single. Ela analisa que, normalmente, espera-se que minas que fazem rap tenham uma voz suave cantando de forma melódica e delicada fazendo os famosos “lovesongs”.

“Nada contra quem faz, a arte é livre pra ser o que quiser”, esclarece ela, que explica que seu som vai na na contramão disso. “‘Baby Prince$$’ é um trap que fala sobre como as mulheres pretas devem se sentir gostosas, independentes, fodas e chefonas. Além de abordar questões como da violência policial. Esse single foi um divisor de águas na minha vida, porque eu entendi que posso falar e fazer o que quiser e como eu quiser, além de passar essa visão”, diz Nic.

“No momento, estou trabalhando no projeto do meu disco com dez faixas que vai ser lançado no final de 2021 com muita surpresa boa”. Estamos no aguardo, Nic.

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