Mc Dricka: ‘Mesmo que eu esteja no nível da Anitta, vou lançar funk putaria’
Com mais de 2,3 milhões de ouvintes mensais no Spotify e com hits que chegam a mais de 55 milhões de visualizações no YouTube, a paulistana, mais precisamente da periferia da Vila Nova Cachoeirinha, zona norte de São Paulo, Fernanda Adrielli, 21, conhecida como Mc Dricka , se tornou uma das mulheres da música mais ouvida no Brasil nessa quarentena. Tudo isso cantando, talvez o gênero mais discriminado da música nacional — funk putaria. Isso só prova uma coisa, sexo na música é uma coisa muito nossa.
No último dia 27 eu tive a oportunidade de conversar com a Dricka, ela falou sobre preconceito, sexualidade e o que pensa da sua carreira para o futuro.
Como está sendo para você isso de ser uma das mulheres da música mais ouvida no momento? Não me lembro de isso ter acontecido antes com outra mulher no funk.
Está sendo gratificante, saca? Porque eu penso o seguinte, beleza, antigamente não tinham essas minas [do funk putaria] sendo as mais ouvidas do brasil, mas elas abriram espaço para que hoje isso acontecesse, elas fundaram o “funk putaria mulher”, estouraram, só não foram as mais ouvidas por que o preconceito antes era bem maior, mas através delas hoje, graças a deus, quebramos um pouco esse tabu, e por meio disso, hoje eu cheguei a ser uma das cantoras mais ouvidas no brasil e no funk.
Quando tudo começou, imaginava esse sucesso?
Eu sempre falo, “se você pensar pequeno você vai ser pequeno, se você pensar grande você vai ser grande”, eu sempre pensei grande mas não como eu estou hoje, né? Sim, já pensava em estourar, mas não como eu estourei. Na verdade nunca é do jeitinho que a gente espera né?
Vejo que você está em todas as paradas por ter músicas colocadas em outros ritmos e também por não cantar só funk. Você pensa em mudar de ritmo em algum momento?
Sempre pensei, na verdade quando acreditei que poderia ser cantora eu pensei da seguinte forma, “vou começar com um ritmo e, aos poucos, vou tentar ir cantando outros também”. Na verdade quero sempre lançar de tudo, nunca pensei em cantar só funk, por que eu me dou bem com todos os ritmos.
Em ‘’Beijo no Pescoço’’ você faz uma música e clipe com um romance com outra mulher, li que você não é gay (posso estar errado), como é abordar esse tema no funk?
Sim, sou gay sim! Quem falou que eu não sou está mentindo. E é meio diferente, as pessoas são bem preconceituosas pelo fato de eu ter uma relação com uma mulher e cantar músicas [com letras] hétero, algumas pessoas não entendem e se perguntam, “mas ela não canta música para hétero?” É tipo isso.
Quando você começou no funk, teve ajuda de outros parceiros, de São Paulo, Belo Horizonte ou outros lugares?
Então, comecei meio que sozinha, eu conheci um projeto que era mais ou menos uma escola de funk, e lá eu aprendi a escrever letras e a ter postura de palco, eles nos davam essa moral, colocavam a gente em cima de um palco e ensinavam como lidar com a situação. Fui me inspirando em outro Mcs e outros artistas na hora de escrever, e aperfeiçoando as minhas letras com o tempo. Daí comecei aqui em São Paulo, mandei [trechos para os Djs colocarem em sons] a minha voz para BH e foi assim que começou.
Quem te inspirou mais a cantar funk putaria?
As cantoras que me revelaram que isso era possível foram a Mc Carol, Mc Marcelly e Tati Quebra Barraco. Elas me passaram a base de como eu poderia escrever as músicas. Olhando os trabalhos das minas eu consegui fazer meus trampos, fazer a minha tendência. E hoje, consigo falar que “eu sou a minha própria referência”.
Foi difícil para você falar de sexo nas músicas?
Sim, tive muitos conflitos internos, até hoje a gente recebe muitas críticas, nem todo mundo aceita a gente como cantora, ainda mais mulher falando de sexo e putaria, mas chegou um certo momento na minha vida que pensei, “se isso é meu sonho eu tenho que ir em frente e fazer”, e se as demais que me inspirei conseguiram, eu também vou conseguir.
Vejo que muitas mulheres se sentem empoderadas por ouvir sua música, você sente que ela tem esse efeito?
Acho que todas as mulheres nascem feministas. Faço música para as mulheres se sentirem empoderadas e feministas. No baile os caras que acham que eles estão bancando e tal, que são “os caras”, porque nós mulheres não podemos ser assim também? Por isso eu escrevo músicas para levantar a autoestima das mulheres, minhas músicas nunca vangloriam os homens — só as mulheres.
Pensa em uma carreira internacional?
Claro! Óbvio, como eu disse, “nunca penso pequeno, sempre grande”, super penso em fazer carreira internacional. Essa hora vai chegar .
E em sair do funk putaria, vai rolar isso algum momento?
Em algum momento da vida eu vou sair para dar espaço para outras pessoas e eu poder ocupar outros espaços. Penso assim, mas claro que de vez em quando ainda vou lançar umas putarias sim, mesmo que eu esteja no nível da Anitta.
O que tem rolado no seus fones de ouvido ultimamente?
Ouço muito funk, muito funk putaria não vou mentir, mas as músicas mais frequentes que ouço é mais de fora, como Travis Scott, Russ e Six Nine —nossa eu sou muito fã dele. Mas por incrível que pareça, pra escrever um funk consciente eu ouço Barões da Pisadinha, você acredita? Ninguém entende, mas faço isso.
Ainda mora com a sua família? Eles tiveram preconceito com seu estilo de música?
Nossa, saí de casa faz mó cota, não moro com a minha mãe, que se chama Andrea, mas geral chama ela de Shirley, meu pai mora com a família dele. E sim, minha família teve preconceito no começo, como eu falei, mulher falando coisas vulgares, sexo ainda . De começo foi meio assim, difícil, mas minha mãe entendeu que era meu sonho, e hoje ela me apoia bastante.
E o funk já fez você melhorar de vida?
Sim, muito . Não só a minha como a da minha família, minha vó Maria, meus irmãos Alice e Miguel . Consigo ajudar todo mundo também , graças a Deus!