‘Precisamos naturalizar as bandas formadas só por mulheres’, diz a poeta e cantora de forró Vitória Rodrigues
“A alegria de fazer o bem é a única felicidade verdadeira”, já diria o escritor russo Leon Tolstói que precisou de 1225 páginas para concluir que não existe paz sem guerra. Ok, posso estar sendo leviano com essa afirmação, mas convenhamos que, durante a pandemia, a paz, pelo menos a que consideramos individual, tem se tornado um artigo cada vez mais raro e a saúde mental do brasileiro tem estado bem precária.
Poucos são os momentos de sanidade que podemos respirar e não pensar nos quase 2.000 mortos diários. Não está fácil.
Uma solução é nos agarrarmos a pequenas pílulas de felicidade, mesmo que momentâneas. Um desses momentos talvez seja assistindo um dos vídeos da Vitória Rodrigues, atriz, cantora e compositora que viralizou recitando poesias em forma de cordéis com muita delicadeza e simplicidade.
Os seus vídeos que, em geral, são curtos e bem motivacionais foram parar nas redes das atrizes Taís Araújo e Ingrid Guimarães, do ator Lázaro Ramos, da atriz e humorista Tatá Werneck, entre outras personalidades— o que acabou levando Vitória para um quadro no programa Saia Justa do canal GNT chamado “De Repente verão”.
Nordestina, natural de Alagoas e com um vasto repertório na cultura popular brasileira, Vitória, por meio de seu Instagram, tem usado seus dias para nos dar pequenos respiros durante esses momentos difíceis que estamos passando. “Eu comecei a produzir vídeos antes da pandemia. Quando veio a quarentena, a forma de não sucumbir aos problemas foi fazer esses vídeos no Instagram. Umas amigas tinham me chamado para fazer um desafio de postar 7 poesias faladas durante 7 dias. Esse desafio me instigou a fazer mais,” comenta a atriz.
Formada em Educação Física pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL), ela não imaginou que seu destino seria a arte. Logo depois de sua formatura, embarcou para o Rio de Janeiro atrás de seu maior sonho até o momento, estudar na escola de teatro Martins Penna. “Esse era meu sonho. Me formei com a peça ‘Nossas Bocas não foram Feitas só para sorrir’. Todo o elenco da peça era preto, e abordávamos os temas que envolviam a negritude em textos autorais. Não falávamos apenas dos problemas de ser preto, mas de coisas boas como amor, amizade. E tinha muita música. Foi esse espetáculo que mudou minha escrita e me fez escrever mais músicas e histórias”, comenta Vitória.
A música nordestina também faz parte da sua trajetória artística. Enquanto morava no Rio, formou com amigas uma banda de forró pé de serra em que, além de cantar, tocava zabumba até que chegou a pandemia. “Eu nasci nesse ambiente musical, meu pai sempre tocou muitos instrumentos, meus tios também. Mesmo sem estudar música, eu sempre achei lindo isso de eles fazerem porque sentem, mesmo sem saber. Então toda essa cultura nordestina me preenche, é uma fonte em que eu bebo demais”, comenta.
Nesta sexta (5/3), Vitória está lançando sua primeira música e clipe, “Muito Prazer, Eu Sou Mulher”, canção feita em homenagem ao dia da mulher, Vitória comenta sobre o fato que sempre enfatizam que sua banda, Forrozinas criada em 2018, é formada apenas por mulheres. “Por que o diferencial da nossa banda é ser só de mulheres? Não vejo falarem que o Falamansa é uma banda só de homens, ou o Arrasta-pé ser uma banda só de homens… Por que a nossa banda não pode ser apenas uma banda de forró?” questiona a cantora. “Quando formamos a banda, não fizemos por ser uma banda só de mulheres, mas acaba que nos rotulam dessa forma. Uma banda é uma banda”, diz.
A pandemia fez com que a Vitória voltasse para sua cidade natal em Alagoas, mas, de forma alguma, limitou seus sonhos e trabalhos. “Essa música ‘Muito Prazer, Eu Sou Mulher’ é baseada em um cordel que escrevi e é o projeto que mais estou focando nesse momento, mas eu tenho muita vontade de escrever um livro com os cordéis e canções que escrevi”, comenta.
Vitória ainda lembra que a realização do clipe apenas foi possível pelo ótimo clima de parceria entre as pessoas que a cercam, e por elas acreditarem na sua arte, no seu projeto e no que a música traz. “O clipe era para ser bem pequeno, mas por conta do abraço dessas pessoas que acreditaram na minha arte, ele cresceu ainda mais, e é isso que importa na vida, a união entre as pessoas e principalmente entre as mulheres, para que seja possível nos acolher, nos amar, segurar nas mãos umas das outras e através disso transformar nossas realidades e nos tornar mais fortes”, comenta.
Tem um ditado que diz “a noite sempre fica mais escura antes do amanhecer”. Aqui no Brasil, a noite já dura 1 ano e 259.271 mortes. Nada é capaz de consolar tanta tristeza nesse momento. Mas pequenas lanternas como a de Vitória Rodrigues, nesse longo período noturno, têm sido essenciais para aguentarmos até o amanhecer.