Cancelamento, bailes na pandemia e gordofobia: um papo com MC Carol

“Sou Carol de Niterói, e vou mandar o papo”, quem é do funk sabe muito bem que quando Carolina de Oliveira Lourenço, 27, mais conhecida como MC Carol fala isso, lá vem pedrada.

Nascida no Morro do Preventório em Niterói, Rio de Janeiro, criada pelos avós e com 10 anos cantando e produzindo funk, MC Carol precisou superar muitos obstáculos para se tornar uma das cantoras mais relevantes do funk nacional.

Com apenas 14 anos e depois da morte do seu avô, Carol foi morar sozinha após ser expulsa de casa. O funk foi sua salvação com o primeiro hit “Minha Vó tá Maluca” em 2010.

Vivendo da música desde os 16 anos e sempre com uma atitude bem empoderada, cantar “funk putaria” fez MC Carol chegar muito longe de Niterói, como mostra sua palestra recente na Universidade Brown, nos Estados Unidos.

A luta contra o racismo, contra a gordofobia e a militância feminista assumida sempre estiveram presentes nas suas letras, mesmo que de forma inconsciente no início. Hoje, o sentimento de autoestima está cada vez mais presente em suas falas e, recentemente, em sua música “Levanta Mina”, que é uma das faixas do seu segundo disco “Borogodó”. 

O álbum será lançado no segundo semestre de 2021. Enquanto isso, ela aproveita para lançar “Amor Próprio É o Nosso Rolê”, um minidocumentário que conta um pouco da história das mulheres registradas no clipe desta música.

Cancelamento, bailes na pandemia e da quebrada para Times Square: bati um papo com a cantora que você confere agora.

 

Quando decidiu ser cantora de funk?

Eu comecei de brincadeira, cantando nos bailes que eu ia. E foi tudo uma surpresa, sabe? O bagulho com a Furacão 2000 com a música “Minha Vó Tá Maluca”, a minha participação no Rock in Rio… Mês passado minha cara estava lá na Times Square. Quem diria que ia tão longe falando putaria? (Risos).

MC Carol estampa propaganda do YouTube na Times Square em Nova York (No twitter @ludmillerr)

Você já cantou trap e rap. Pensa em mudar de ritmo como samba, por exemplo?

Eu amo rap. Muito mesmo. E adoro pagode também. Em passagem de som, em reunião de amigos eu canto umas Nina Simone, umas Amy Winehouse e até umas músicas em francês, mas não sei se seria uma mudança de ritmo. Sinto que o funk é a ferramenta que sei melhor usar.

Quais as suas referências musicais?

Ah, são muitas! Essas que falei antes, a Nina e Amy são algumas delas. Eu adoro o Djonga, o Filipe Ret… E bem, eu cresci querendo ser a Tati Quebra-Barraco.

Você tem uma música com a Karol Conká, como foi ver ela ser “cancelada”? O que acha sobre esse assunto?

Ainda não falamos, mas acredito em segundas chances. Espero que seja um momento de reflexão.

Quando você percebeu que era “100% feminista”?

Pois é, sempre teve isso, né? Eu que não sabia o que era feminista! (Risos). Quando começaram a me chamar pra participar de evento na faculdade que me explicaram. Eu cresci cercada por mulheres fortes e que se impõe, acho que vem daí.

Como enxerga as críticas quando dizem que o funk proibidão oprime as mulheres?

Eu entendo e concordo, mas queria ver essas mesmas críticas quando o rock, o sertanejo, o rap ou o pagode é machista também.

Qual sua maior dificuldade no funk?

Sempre ter que me impor, sabe? Isso é algo que não é só no meio do funk, é algo de ser mulher nesse mundo.

 

Recentemente você disse no Twitter: “Sei lá, as vezes eu sinto que deveria ter feito mais merdas, pra dar jus a fama que carrego”, que fama é essa que você carrega? Acha que o tipo de música que canta tem influência nisso?

É que o pessoal acha que eu sou 100% do tempo Carol Bandida! Eu também sou a Carolina, frágil, que só quer ficar em casa de amorzinho. Eu sinto que me transformo no palco.

Já pensou em desistir da carreira?

Ah, sempre! A gente ouve muita merda diariamente. Se você não tem a cabeça no lugar, você surta.

Como tem se virado financeiramente em meio a pandemia?

Tá complexo. Me virando pra manter tudo e apoiar a família. Aí estamos buscando mais parcerias com marcas, projetos diferentes.

Acha que o funk é mais criminalizado e criticado hoje ou já tivemos períodos piores?

Boa pergunta, eu não sei. Tem dias que acordo achando que tá tudo melhorando, tem dias que parece que o pior ainda está por vir. Foi bem complicado no período da prisão do Rennan da Penha, mas é uma vitória de cada vez

Qual sua opinião sobre as prisões recentes dos MCs? E dos bailes feitos durante a pandemia?

Eu não sei dizer pq não sei a realidade de cada um. Tem gente que tá na ganância e tem gente que tá na necessidade.

No seu documentário você fala sobre “diversas formas do feminino”, o que seria isso?

É aquilo que falo até na música “Levanta Mina”: pode ser do jeito que você é, gorda, magra, gay, hetero, trans, o que for. Sinto que estamos lutando contra um inimigo comum que é o preconceito.

Você sempre tem falado sobre racismo e gordofobia nas suas redes. Acha que a mulher sofre mais nesse sentido? Já cantou sobre gordofobia ou pensa em cantar sobre?

Sofre mais! Essa música que lancei, “Levanta Mina”, é sobre isso. E eu fiz porque eu precisava ouvir aquilo, que eu era forte e linda do jeito que sou. Eu sinto que eu estar no palco, na frente de muita gente, falando de sexualidade já é uma afronta para quem é gordofóbico e quer que a gente se esconda.

Quais serão os próximos passos?

Agora é finalizar e lançar o novo álbum Borogodó, que foi adiado pela pandemia. E a lista de participações dos sonhos nas músicas é infinita, isso é bom porque vai ter muita música ainda pra ser feita!